A história ainda não tem um veredicto sobre as mensagens atribuídas ao presidente, deixadas como testamento político, por ocasião de seu suicídio.
O adeus: foto
publicada em jornais, em agosto de 1954, para anunciar o suicídio/ Enterro em
São Borja (RS): comoção popular varreu o país
Antes de se
suicidar com um tiro no peito, Getúlio Vargas (1882-1954) escreveu uma carta-testamento
ainda hoje polêmica, pois existem dela duas versões: uma manuscrita, bastante
concisa, e outra mais longa, datilografada, que foi distribuída para a imprensa
como a mensagem oficial do político ao povo brasileiro. Em ambas, porém,
Getúlio informa que deu cabo à própria vida em virtude de pressões de grupos
internacionais e nacionais contrários ao trabalhismo – ou seja, criou sua
versão das “forças ocultas” que algumas vezes leva a rupturas no poder.
Os dois
documentos são ainda um libelo pró-nacionalismo e recendem personalismo, uma
das marcas registradas do político. Getúlio se colocou, até na hora da morte,
como defensor do povo e líder martirizado justamente para libertar os
brasileiros. “Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar
sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este
meio de estar sempre convosco”, registra a versão datilografada. No manuscrito,
há um trecho com recado semelhante. “Velho e cansado, preferi ir prestar contas
ao Senhor, não dos crimes que não cometi, mas de poderosos interesses que
contrariei, ora porque se opunham aos próprios interesses nacionais, ora porque
exploravam, impiedosamente, aos pobres e aos humildes.”
Há quem
atribua o estilo do texto “oficial” ao redator dos discursos de Vargas, o
jornalista José Soares Maciel Filho. De fato, Maciel Filho confirmou à família
do presidente que datilografou a versão lida para a imprensa, mas nada disse
sobre tê-la modificado. De todo modo, por causa da carta-testamento, Maciel
Filho é conhecido como o ghost-writer que saiu da sombra habitual do redator de
aluguel para entrar para a história.
TEXTO
MANUSCRITO
CPDOC/FGV
“Deixo à
sanha dos meus inimigos, o legado da minha morte. Levo o pesar de não ter
podido fazer, por este bom e generoso povo brasileiro e principalmente pelos
mais necessitados, todo o bem que pretendia. A mentira, a calúnia, as mais
torpes invencionices foram geradas pela malignidade de rancorosos e gratuitos
inimigos numa publicidade dirigida, sistemática e escandalosa.
Acrescente-se
a fraqueza de amigos que não defenderam nas posições que ocupavam à felonia de
hipócritas e traidores a quem beneficiei com honras e mercês, à insensibilidade
moral de sicários que entreguei à Justiça, contribuindo todos para criar um
falso ambiente na opinião pública do país contra a minha pessoa.
Se a simples
renúncia ao posto a que fui levado pelo sufrágio do povo me permitisse viver
esquecido e tranquilo no chão da pátria, de bom grado renunciaria.
Mas tal
renúncia daria apenas ensejo para, com mais fúria, perseguirem-me e
humilharem-me.
Querem
destruir-me a qualquer preço. Tornei-me perigoso aos poderosos do dia e às
castas privilegiadas.
Velho e
cansado, preferi ir prestar contas ao Senhor, não dos crimes que não cometi,
mas de poderosos interesses que contrariei, ora porque se opunham aos próprios
interesses nacionais, ora porque exploravam, impiedosamente, aos pobres e aos
humildes.
Só Deus sabe
das minhas amarguras e sofrimentos.
Que o sangue
dum inocente sirva para aplacar a ira dos fariseus.
Agradeço aos
que de perto ou de longe me trouxeram o conforto de sua amizade.
A resposta do
povo virá mais tarde...”
TEXTO
DATILOGRAFADO
“Mais uma vez
as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e se desencadeiam sobre
mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam; e não me dão o direito
de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não
continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o
destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos
econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci.
Iniciei o trabalho
de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar.
Voltei ao governo nos braços do povo.
A campanha
subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais
revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros
extraordinários foi detida no Congresso. Contra a Justiça da revisão do salário
mínimo se desencadearam os ódios.
Quis criar a
liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobras,
mal começa esta a funcionar a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi
obstaculada até o desespero. Não querem que o povo seja independente.
Assumi o
governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os
lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de
valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões
de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se nosso principal produto.
Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa
economia a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado
mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante,
incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo e renunciando a mim
mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso
dar a não ser o meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém,
querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha
vida.
Escolho este
meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma
sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso
peito a energia para a luta por vós e vossos filhos.
Quando vos
vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação.
Meu
sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada
gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a
vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com perdão. E aos que
pensam que me derrotam respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje
me liberto para a vida eterna. Mas esse povo, de quem fui escravo, não mais
será escravo de ninguém.
Meu
sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu
resgate.
Lutei contra
a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de
peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei
a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o
primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na
história.”
Fonte de todo o texto: http://www2.uol.com.br/historiaviva/artigos/as_duas_cartas_de_getulio_vargas.html
Aliás visitem o site acima, muito interessante
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